Neste mês que é o de Abril, festeja-se a liberdade... de expressão, festeja-se todas as liberdades.
Por isso deixo aqui um excerto de um texto que faz parte de uma peça para ser feita em Abril.
"(No palco está um cenário a preto com um cravo vermelho pintado, luz negra entre cada cena, narradores vestidos de pretos, eventualmente com um apontamento de vermelho, umas luvas por exemplo)
- Hoje, vamos festejar Abril...
- ... hoje vamos festejar a vida, a tua, a minha...
- ... a nossa, a vossa liberdade de poder afirmar eu sou...
- ... eu e estou de bem com a vida.
- Não há cá vai - se andando, aqui, só se vai estar sempre bem.
- Porque é bom poder dizê-lo aos sete ventos...
- ... gritar para quem quiser ouvir...
- ... adoro viver!
- Sem repreensões, sem dúvidas que exista alguém na sombra de cada esquina, que coloque em dúvida quem somos e o que fazemos.
- Esta, é a nossa missão esta noite, ainda que por vezes impossível...
- É sempre bom poder sonhar com um mundo melhor...
- É sempre bom poder sonhar...
- “Que o mundo pula e avança, como uma bola colorida, por entre as mãos de uma criança. “
(Cantar/ Dançar "Pedra Filosofal "– António Gedeão)
- Agora com as almas já aquecidas pelo calor da música...
- Vamos ao concreto e ao propósito de nos reunirmos hoje nesta sala.
- Não estamos aqui para pedir dinheiro...
- ... estamos cá para alertar consciências...
- ... para vos dar conhecimento do rumo que a expressão e a sua liberdade pode tomar quando erramos...
- ... ainda que sem intenção, ignorando o passado.
- Querendo no presente ocultar o que outros fizeram...
- ... para que hoje possamos gozar do nosso próprio á vontade nas questões básicas da vida.
- Desde a política, á vida social, poder decidir ou não...
- ... se estamos bem ou mal e se queremos mudar algo na nossa vida.
(Cantar "Muda de vida" – António Variações)
- O que esta noite parece algo de comum...
- ... nós aqui deste lado, dando-vos um pouco daquilo que cada um de nós sabe fazer...
- ... e desse lado, a partilha de opiniões...
- ... a critica construtiva...
- ... que para nós é tão importante, era quase inexistente não há muitos anos.
- O que os livros de história não contam...
- ... as emoções, os sofrimentos...
- ... os sorrisos e as lágrimas...
- ... nós hoje vamos contar aqui.
(No fundo da sala está Alferes Gonçalves e é interpelado por um soldado):
Soldado – “Mê alferes, o Rodrigues está, de arma aperrada, á entrada da caserna dos condutores e diz que “limpa” o primeiro que lá quiser entrar. Está muito nervoso, fora de si, parece o diabo em pessoa. Ai que desgraça!
(O Alferes dirige-se para o corredor entre o público e o soldado vai atrás dele dizendo):
Soldado – Onde é que vai mê alferes? Olhe que ele mata-o.
(Sem dar ouvidos avança, ainda que á cautela. Soldado Rodrigues está de arma apontada a ele, chora e treme dizendo):
Rodrigues – Não avance meu alferes, olhe que eu disparo... Vou-me matar, e quem tentar impedir-me, lixo-o, vai á minha frente.
(Dando mais um passo o alferes questiona):
Alferes Gonçalves – Oh Rodrigues, deixa-te de merdas, tens alguma coisa contra mim, tens algo contra alguém, tens razão de queixa dos teus camaradas?
Rodrigues – Não avance, meu alferes, não avance, merda... Olhe que eu disparo.
(Na sala estão alguns soldados a observar a situação. O alferes Gonçalves avança para Rodrigues decidido, embora cauteloso dizendo):
Alferes Gonçalves – Vais entregar-me essa merda dessa G3... eu vou avançar... (voltando-se para trás para os soldados) e vocês, regressem ás vossas tarefas. Eu e o Rodrigues temos de conversar... Dás-me essa arma?
(Diz estendendo as mãos. Ao receber a arma, os dois homens caiem nos braços um do outro, Rodrigues chorando desalmadamente como uma criança e o alferes Gonçalves fazendo um extremo esforço para não fazer o mesmo.
Os soldados ainda lá estavam, uns suspirando de alívio, outros chorando, quando o alferes volta a dizer):
Alferes Gonçalves – Não ouviram? Regressem ás vossas tarefas! Eu e o Rodrigues vamos conversar.
(Os soldados dispersam)
Alferes Gonçalves – Homem, agora conta-me lá, o que se passou dentro dessa cabeça? Estás com algum problema?
Rodrigues – Ó meu alferes, eu não sei, estou farto disto...
Alferes Gonçalves – Mas olha lá rapaz, quem é que não está?
Rodrigues – O senhor desculpe isto que aconteceu, se me quiserem castigar façam-no, eu sei que mereço. Mas não me conformo, quando sai de Lisboa, tinha prometido ao meu pai, que nada me aconteceria, no entanto desde que cá estou já fui parar á enfermaria quatro vezes, eu não presto para aqui estar.
Alferes Gonçalves – Rodrigues, esquece o castigo, isto morre aqui. Agora deixa-te dessas coisas e vê se te acalmas.
Rodrigues – Obrigado, meu alferes, obrigado por tudo.
Alferes Gonçalves – Obrigado por nada, vamos lá ali beber umas Cucas e esquecer isto rapaz. Vá, vem daí.
(Personagens saem de cena)
- Os momentos de loucura pura e dura, as feridas da alma...
- ... perduram em muitos homens até aos dias de hoje.
- Muitos deixaram de viver as suas próprias vidas...
- ... para embarcarem na viagem ao universo dos fantasmas e sonhos maus.
- Abandonados á sua sorte, pelas famílias e pela sociedade...
- ... muitos são os chamados sem abrigo que habitam as nossas ruas e alguns hospitais psiquiátricos...
- ... a quem nós olhamos de lado com pena e desprezo.
- Quem sabe, um dia tenham algo mais para nos contar...
- ... no dia em que pensarmos pormo-nos na pele deles...
- ... quem sabe acordarão por fim do sonho mau...
- ... e passarão a ser pessoas como nós.
(Canção “Aquele Inverno” – Delfins) (...)"
Por isso deixo aqui um excerto de um texto que faz parte de uma peça para ser feita em Abril.
"(No palco está um cenário a preto com um cravo vermelho pintado, luz negra entre cada cena, narradores vestidos de pretos, eventualmente com um apontamento de vermelho, umas luvas por exemplo)
- Hoje, vamos festejar Abril...
- ... hoje vamos festejar a vida, a tua, a minha...
- ... a nossa, a vossa liberdade de poder afirmar eu sou...
- ... eu e estou de bem com a vida.
- Não há cá vai - se andando, aqui, só se vai estar sempre bem.
- Porque é bom poder dizê-lo aos sete ventos...
- ... gritar para quem quiser ouvir...
- ... adoro viver!
- Sem repreensões, sem dúvidas que exista alguém na sombra de cada esquina, que coloque em dúvida quem somos e o que fazemos.
- Esta, é a nossa missão esta noite, ainda que por vezes impossível...
- É sempre bom poder sonhar com um mundo melhor...
- É sempre bom poder sonhar...
- “Que o mundo pula e avança, como uma bola colorida, por entre as mãos de uma criança. “
(Cantar/ Dançar "Pedra Filosofal "– António Gedeão)
- Agora com as almas já aquecidas pelo calor da música...
- Vamos ao concreto e ao propósito de nos reunirmos hoje nesta sala.
- Não estamos aqui para pedir dinheiro...
- ... estamos cá para alertar consciências...
- ... para vos dar conhecimento do rumo que a expressão e a sua liberdade pode tomar quando erramos...
- ... ainda que sem intenção, ignorando o passado.
- Querendo no presente ocultar o que outros fizeram...
- ... para que hoje possamos gozar do nosso próprio á vontade nas questões básicas da vida.
- Desde a política, á vida social, poder decidir ou não...
- ... se estamos bem ou mal e se queremos mudar algo na nossa vida.
(Cantar "Muda de vida" – António Variações)
- O que esta noite parece algo de comum...
- ... nós aqui deste lado, dando-vos um pouco daquilo que cada um de nós sabe fazer...
- ... e desse lado, a partilha de opiniões...
- ... a critica construtiva...
- ... que para nós é tão importante, era quase inexistente não há muitos anos.
- O que os livros de história não contam...
- ... as emoções, os sofrimentos...
- ... os sorrisos e as lágrimas...
- ... nós hoje vamos contar aqui.
(No fundo da sala está Alferes Gonçalves e é interpelado por um soldado):
Soldado – “Mê alferes, o Rodrigues está, de arma aperrada, á entrada da caserna dos condutores e diz que “limpa” o primeiro que lá quiser entrar. Está muito nervoso, fora de si, parece o diabo em pessoa. Ai que desgraça!
(O Alferes dirige-se para o corredor entre o público e o soldado vai atrás dele dizendo):
Soldado – Onde é que vai mê alferes? Olhe que ele mata-o.
(Sem dar ouvidos avança, ainda que á cautela. Soldado Rodrigues está de arma apontada a ele, chora e treme dizendo):
Rodrigues – Não avance meu alferes, olhe que eu disparo... Vou-me matar, e quem tentar impedir-me, lixo-o, vai á minha frente.
(Dando mais um passo o alferes questiona):
Alferes Gonçalves – Oh Rodrigues, deixa-te de merdas, tens alguma coisa contra mim, tens algo contra alguém, tens razão de queixa dos teus camaradas?
Rodrigues – Não avance, meu alferes, não avance, merda... Olhe que eu disparo.
(Na sala estão alguns soldados a observar a situação. O alferes Gonçalves avança para Rodrigues decidido, embora cauteloso dizendo):
Alferes Gonçalves – Vais entregar-me essa merda dessa G3... eu vou avançar... (voltando-se para trás para os soldados) e vocês, regressem ás vossas tarefas. Eu e o Rodrigues temos de conversar... Dás-me essa arma?
(Diz estendendo as mãos. Ao receber a arma, os dois homens caiem nos braços um do outro, Rodrigues chorando desalmadamente como uma criança e o alferes Gonçalves fazendo um extremo esforço para não fazer o mesmo.
Os soldados ainda lá estavam, uns suspirando de alívio, outros chorando, quando o alferes volta a dizer):
Alferes Gonçalves – Não ouviram? Regressem ás vossas tarefas! Eu e o Rodrigues vamos conversar.
(Os soldados dispersam)
Alferes Gonçalves – Homem, agora conta-me lá, o que se passou dentro dessa cabeça? Estás com algum problema?
Rodrigues – Ó meu alferes, eu não sei, estou farto disto...
Alferes Gonçalves – Mas olha lá rapaz, quem é que não está?
Rodrigues – O senhor desculpe isto que aconteceu, se me quiserem castigar façam-no, eu sei que mereço. Mas não me conformo, quando sai de Lisboa, tinha prometido ao meu pai, que nada me aconteceria, no entanto desde que cá estou já fui parar á enfermaria quatro vezes, eu não presto para aqui estar.
Alferes Gonçalves – Rodrigues, esquece o castigo, isto morre aqui. Agora deixa-te dessas coisas e vê se te acalmas.
Rodrigues – Obrigado, meu alferes, obrigado por tudo.
Alferes Gonçalves – Obrigado por nada, vamos lá ali beber umas Cucas e esquecer isto rapaz. Vá, vem daí.
(Personagens saem de cena)
- Os momentos de loucura pura e dura, as feridas da alma...
- ... perduram em muitos homens até aos dias de hoje.
- Muitos deixaram de viver as suas próprias vidas...
- ... para embarcarem na viagem ao universo dos fantasmas e sonhos maus.
- Abandonados á sua sorte, pelas famílias e pela sociedade...
- ... muitos são os chamados sem abrigo que habitam as nossas ruas e alguns hospitais psiquiátricos...
- ... a quem nós olhamos de lado com pena e desprezo.
- Quem sabe, um dia tenham algo mais para nos contar...
- ... no dia em que pensarmos pormo-nos na pele deles...
- ... quem sabe acordarão por fim do sonho mau...
- ... e passarão a ser pessoas como nós.
(Canção “Aquele Inverno” – Delfins) (...)"
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