Na continuação do texto anterior, deixo aqui uma segunda parte desta peça, falando sobre os "famosos" interrogatórios que a PIDE fazia...
(Narradores trazem uma cadeira e colocam-na no centro do palco)
- Ser ou não ser, já escrevia Shakespeare.
- Eis a questão?
- Qual?
- A questão fundamental do nosso viver.
- Da nossa maneira de estar perante a vida...
- ... e perante a sociedade tão castradora ontem...
- ... tal como ainda hoje.
- Usar o amarelo...
- ... assim como o Laranja ou o vermelho...
- ... sem que nos apontem um dedo acusatório.
-Ter direito a vida própria, fazer opções, orientações...
- ... sem que para andar na rua...
- ... tenhamos que olhar para um lado...
- ... e para o outro, com medo que a escuridão dos enfatiados...
- ... nos venha absorver todas as nossas forças e vontades.
(Sentado no público está a personagem António, surgem dois homens vestidos de gabardinas escuras e chapéus, focos de luz apontam para as personagens)
Pide 1 – Ó amigo, você chama-se António Alves, não é?
António – Chamo porquê? Os senhores desejam alguma coisa?
Pide 2- Porque o senhor tem de nos acompanhar.
António – Acompanhar? Eu não vos vou acompanhar coisíssima nenhuma, eu tenho é de ir para casa descansar e ver o meu filho e a minha mulher...
Pide 2 – Xiuuu...pianinho...o senhor vem connosco e mais nada.
António – Mas qual quê... Eu tenho os meus direitos...mas onde é que eu vou com vocês e porquê? Eu não vou e não vou mesmo.
Pide 1 – Mas quais direitos...você tem é o direito de estar muito caladinho e mais nada.
(Os homens levantam António á força e empurram-no pelo corredor, cada um agarrando um braço, António tenta fazer finca pé. No palco encontra-se uma cadeira colocada no centro do palco com um foco por cima dela.
António é sentado na cadeira, os dois homens saem, faz-se um compasso de espera de dois, três segundos e entra um outro homem que diz):
Pide 3 – O freguês é este? Então conta-me lá, diz lá tudo o que tens para me dizer!
(Momento de espera)
Então não falas? O gato comeu-te a língua foi? Vá lá, quanto mais depressa falares, mais depressa vais para “casa descansar ver o teu filho e a tua mulher...”
(Momento de espera, seguido de um grito aos ouvidos de António)
Fala, meu sacana ou ainda te arranco a língua!
António – (Muito calmamente) Eu não tenho nada para lhe dizer!
Pide 3 – (De costas para António)
Ai não companheiro? Vais ver que não tarda muito, começas a cantar como um passarinho!
(Agarrando-o pelos cabelos)
Então, agora falas ou nem por isso? Vá, começa lá a cantar!
António – Não vou falar, não tenho nada para dizer, largue-me seu filho da mãe!
Largue-me ou eu...
Pide 3 – Ou tu... ou tu o quê? O que é que tu fazes? Então querias reivindicar, não era?
E agora não falas pois não?
(Gritando, segurando-o pelos colarinhos)
Pois não?
(Dando um pontapé na cadeira, obrigando António a ficar de pé)
Já que não queres falar, ficas ai de pé até achares que já tens alguma coisa para nos dizer.
Ai quietinho, nem um pio, ahh, não te quero ouvir respirar, nem uma mosca sequer.
(Dando-lhe palmadinhas na cara.
António olha-o fixamente e cospe-lhe a cara)
Pide 3 – (Limpando a cara, com as costas da mão)
Meu safardolas! Tu estás a pedi-las...
(dando-lhe um murro na cara e saindo da sala, foco continua a iluminar António, faz-se silêncio, entram o narradores)
- Hoje, quem serão estas pessoas?
- Viverão com algum peso na consciência pelo mal que fizeram?
- A mente estará atrofiada?
- Conseguirão deitar a cabeça na almofada e dormir descansados de noite?
- Ou levaram consigo este peso para a cova?
- Ou será que a perversidade funciona como uma borracha e hoje já nem se lembram do que fizeram?
(António ainda se aguenta em pé algum tempo, depois começa a sentir-se fraco e acaba por cair.
Narradores agarram na cadeira e colocam-na de maneira que se possa ver António no chão, um deles senta-se)
- Parem...
- Pensem...
- Olhem para a cadeira que está ao vosso lado? Conseguiram analisar se a pessoa que está lá sentada seria capaz de atrocidades como estas?
- Olhando para o mundo á vossa volta...
- Conseguiriam identificar alguém capaz de tais crueldades?
(Narradores agarram no homem e levam-no para fora de cena.
Canção de Zeca Afonso “Os Vampiros”)
(Narradores trazem uma cadeira e colocam-na no centro do palco)
- Ser ou não ser, já escrevia Shakespeare.
- Eis a questão?
- Qual?
- A questão fundamental do nosso viver.
- Da nossa maneira de estar perante a vida...
- ... e perante a sociedade tão castradora ontem...
- ... tal como ainda hoje.
- Usar o amarelo...
- ... assim como o Laranja ou o vermelho...
- ... sem que nos apontem um dedo acusatório.
-Ter direito a vida própria, fazer opções, orientações...
- ... sem que para andar na rua...
- ... tenhamos que olhar para um lado...
- ... e para o outro, com medo que a escuridão dos enfatiados...
- ... nos venha absorver todas as nossas forças e vontades.
(Sentado no público está a personagem António, surgem dois homens vestidos de gabardinas escuras e chapéus, focos de luz apontam para as personagens)
Pide 1 – Ó amigo, você chama-se António Alves, não é?
António – Chamo porquê? Os senhores desejam alguma coisa?
Pide 2- Porque o senhor tem de nos acompanhar.
António – Acompanhar? Eu não vos vou acompanhar coisíssima nenhuma, eu tenho é de ir para casa descansar e ver o meu filho e a minha mulher...
Pide 2 – Xiuuu...pianinho...o senhor vem connosco e mais nada.
António – Mas qual quê... Eu tenho os meus direitos...mas onde é que eu vou com vocês e porquê? Eu não vou e não vou mesmo.
Pide 1 – Mas quais direitos...você tem é o direito de estar muito caladinho e mais nada.
(Os homens levantam António á força e empurram-no pelo corredor, cada um agarrando um braço, António tenta fazer finca pé. No palco encontra-se uma cadeira colocada no centro do palco com um foco por cima dela.
António é sentado na cadeira, os dois homens saem, faz-se um compasso de espera de dois, três segundos e entra um outro homem que diz):
Pide 3 – O freguês é este? Então conta-me lá, diz lá tudo o que tens para me dizer!
(Momento de espera)
Então não falas? O gato comeu-te a língua foi? Vá lá, quanto mais depressa falares, mais depressa vais para “casa descansar ver o teu filho e a tua mulher...”
(Momento de espera, seguido de um grito aos ouvidos de António)
Fala, meu sacana ou ainda te arranco a língua!
António – (Muito calmamente) Eu não tenho nada para lhe dizer!
Pide 3 – (De costas para António)
Ai não companheiro? Vais ver que não tarda muito, começas a cantar como um passarinho!
(Agarrando-o pelos cabelos)
Então, agora falas ou nem por isso? Vá, começa lá a cantar!
António – Não vou falar, não tenho nada para dizer, largue-me seu filho da mãe!
Largue-me ou eu...
Pide 3 – Ou tu... ou tu o quê? O que é que tu fazes? Então querias reivindicar, não era?
E agora não falas pois não?
(Gritando, segurando-o pelos colarinhos)
Pois não?
(Dando um pontapé na cadeira, obrigando António a ficar de pé)
Já que não queres falar, ficas ai de pé até achares que já tens alguma coisa para nos dizer.
Ai quietinho, nem um pio, ahh, não te quero ouvir respirar, nem uma mosca sequer.
(Dando-lhe palmadinhas na cara.
António olha-o fixamente e cospe-lhe a cara)
Pide 3 – (Limpando a cara, com as costas da mão)
Meu safardolas! Tu estás a pedi-las...
(dando-lhe um murro na cara e saindo da sala, foco continua a iluminar António, faz-se silêncio, entram o narradores)
- Hoje, quem serão estas pessoas?
- Viverão com algum peso na consciência pelo mal que fizeram?
- A mente estará atrofiada?
- Conseguirão deitar a cabeça na almofada e dormir descansados de noite?
- Ou levaram consigo este peso para a cova?
- Ou será que a perversidade funciona como uma borracha e hoje já nem se lembram do que fizeram?
(António ainda se aguenta em pé algum tempo, depois começa a sentir-se fraco e acaba por cair.
Narradores agarram na cadeira e colocam-na de maneira que se possa ver António no chão, um deles senta-se)
- Parem...
- Pensem...
- Olhem para a cadeira que está ao vosso lado? Conseguiram analisar se a pessoa que está lá sentada seria capaz de atrocidades como estas?
- Olhando para o mundo á vossa volta...
- Conseguiriam identificar alguém capaz de tais crueldades?
(Narradores agarram no homem e levam-no para fora de cena.
Canção de Zeca Afonso “Os Vampiros”)
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